sexta-feira, 24 de julho de 2009

OLHARES SOBRE UMA VILA FORA DO NOTICIÁRIO


Amigos
Não demorou muito e meu amigo Francisco respondeu ao chamado. A Vila do Joâo no Complexo da Maré está vivendo dias de confronto aberto, mortal. Luta por território. Lá já estive duas vezes, lá tenho alguns laços de afeto. Além do baião-de-dois. Em campo, sempre penso em como descrever as principais passagens das favelas onde vou. Como na Rocinha, a rua principal é repleta de todo tipo de comércio, muita poluição sonora, motos, e pessoas, acima de tudo, indo e vindo. E pelas entradas das ruas, vamos vendo as edificações que se expandem verticalmente.
O que podemos fazer é amplificar a mensagem de Francisco para que a população fluminense saiba que moradores estão sendo alvejados, que muitas pessoas têm sua rotina de trabalho alterada, que garotos se filiam ao tráfico sem terem nenhuma vocação para bandidos.... Vamos ao que enviou Francisco:
Hoje talvez meu olhar perceba apenas o que meu coração sente. Esses dias de angústia intensa, provocada pela intensificação de confrontos entre polícia e traficantes de facções rivais e agravado pelos resultados desses confrontos talvez faça com que meu olhar não ultrapasse os muros, becos e ruas de minha comunidade. É interesse e reparar no olhar das pessoas em tempos de confrontos agudos. Estão sempre atentos a todos os movimentos, ao vai e vem das pessoas, ao menor movimento de um carro, de uma moto, as aparições em janelas, ou seja, literalmente ligados. Mais do que falcão o fogueteiro da favela precisa ter olhos de águia e agilidade de rato pra se esconder, pois disso depende a sua vida e de seus companheiros de facção. Os olhares acompanham os sons de diferentes calibres de potentes armas de fogo. Olhares que se fecham diante dos altíssimos decibéis. Olhares que se fecham mais cedo e que a cada manhã se abrem ávidos nas bancas de jornais a procura de notícias, de vestígios nas ruas, de esperança num desfecho que traga um pouco de paz. Olhares que se fecham novamente mas que dessa vez se abrem acompanhados de lágrimas de dor ao saber que mais um morador, um inocente, foi vitimado pela ação estúpida e infeliz de grupos armados. Estranhamente nada nos jornais, nada nos noticiários da tv, nada em lugar algum a não ser nos olhares e no coração dessa gente que não se cansa de olhar e não ser olhada.
Abraços, Francisco Marcelo Observatório de Favelas do RJ

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