segunda-feira, 27 de julho de 2009

Efeito Colateral

Antes de escrever sobre o quero escrever acho importante situá-los da atual situação política-criminal do território de onde falo. A Vila do João, onde moro, junto com mais cinco favelas era “dominada” pela facção criminosa A.D.A. (Amigos Dos Amigos). Essa facção mais as facções CV (Comando Vermelho) e TCP (Terceiro Comando Puro) e os Milicianos, são responsáveis pelo “domínio” territorial, político, econômico e social das dezesseis comunidades que compõem o bairro Maré. Essa é a composição da disputa geográfica dos grupos armados em confronto no bairro Maré.

Como podem imaginar, a relação entre essas facções se dá pelo confronto armado na disputa por ampliação do controle territorial. O que acontece hoje na Vila do João e as demais favelas que eram controladas pela facção ADA. É uma investida muito forte da facção rival TCP, que dominou 50% do território que antes era controlado pela facção ADA e, ainda tenta conquistar os outros 50%. A ADA por sua vez tenta assegurar o que lhe restou e tentar recuperar a parte que perdeu, sem muito sucesso, até o momento.

Esse é um pouco o cenário atual. Não é preciso lembrar que são grupos com armas de grosso calibre, sem nenhuma preparação e ávidos por vingança. Isso vai dar numa constante troca de tiros e investidas sucessivas por ambas facções. Desses confrontos quem mais sai prejudicado é o(a) morador(a). Somos nós as vítimas do chamado efeito colateral. Os relatos e depoimentos são os mais tristes, preocupantes e trágicos que se possa imaginar. Nunca antes, na minha história dentro da Maré tive tantas pessoas próximas vitimadas de alguma forma, pelos confrontos entre facções rivais ou entre facções e a polícia. Morreu um senhor morador da minha rua na quinta-feira passada porque foi obrigado a transportar traficantes em meio a uma imensa troca de tiros. A Kombi foi fuzilada pelos traficantes rivais e o senhor morreu. Meu vizinho teve a casa fuzilada e invadida porque traficantes invasores que pensaram terem visto inimigos na casa dele. Ele tem mulher e filha pequena e sua mãe mora na parte de cima da casa. Ontem fiquei perdido no meio de uma troca de tiros em meio a uma escuridão provocada por uma queda de energia e soube que um amigo tomou um tiro na perna. Meu irmão, “veterano de guerra” relembrou os tempos de palafita e teve que rastejar em casa para chegar aos interruptores e conseguir apagar as luzes da casa e assim evitar um possível pedido de guarida por algum traficante. Em outro caso, um amigo nosso teve a casa invadida por policiais e foi acordado com fuzil na cara. São inúmeros os casos. São muitos os óbitos. São vários os feridos fisicamente, socialmente e psicologicamente.

Pessoas inocentes, trabalhadores, pais de família, cidadãos. Pessoas que estão tendo arrancado de si a esperança de uma vida melhor. Que vivem o medo e o risco eminente de uma morte violenta e sem terem a quem pedir socorro.

Como exigir dessas pessoas um voto “consciente”? Como convencê-las de procurar os meios legais para reivindicar seus direitos se nem mesmo se veem como sujeitos corporificados de direito? Cadê o acesso aos instrumentos legais? Onde estão os tais Direitos Humanos, tão ventilados nos últimos tempos? É necessário urgentemente criar meios de acessibilidade a mecanismos que garantam direitos primordiais como o direito de ir e vir e, principalmente, o direito a vida. Sem a garantia de acesso a esses mecanismos fica muito difícil mudar a cultura do macaquinho que nada ver, nada sabe e nada ouve.

Nesses dias de luto e violência tem me levado a refletir mais sobre a favela. Por mais que a violência tenha crescido junto com as favelas, ela [a favela] sempre tentou manter o que mais tem valor: a alegria e a força do seu povo. Mas só isso não basta. Precisamos sair as ruas. Precisamos lutar por dignidade, por respeito, pela vida. Ultimamente só vejo medo nos olhos das pessoas. Nem mesmo o baile funk tão necessário para descarregar nossas angústias e depressões existe mais. Está proibido pela polícia. Chegaram a ponto de proibir sua execução em festa particular, é repressão demais. Tenho andando assustado, quase não paro na rua, não vejo meus amigos, me assusto com criança correndo, barulho de moto, gente gritando, com o silêncio. Quantos de nós passamos por problemas psicológicos? Quantos sabem disso? Assim tem sido nossos dias e noites. Do jeito que ta não da pé, do jeito que ta só a fé.

Francisco Marcelo - Morador da Vila do João e estudante de geografia da UFF

domingo, 26 de julho de 2009

Da impossibilidade de esquecer


No exato momento eu que finalizo a tese, um processo estranho ocorre pelos dias: são 01:00 da manhã e acabo de lembrar de minha primeira percepção do mundo aos 3 anos na baica de alumínio em que minha vó me deu banho. è a lembrança primeira que tenho. Fora isto, tenho voltado aos dias em que andava com vestidos floridos e algumas coisas eu gostaria de esquecer. para isto escrevi uns 10 cadernos, forma de encarar separações, medos e desafios de todo o tipo. lembrei de uma colega de faculdade em uma situação que ocorreu no ano de 1993, no banheiro do restaurante universitário: comentários sobre espinhas. Ao mesmo tempo em que fecho o texto sobre EScola de Chicago, lembro de aulas desastrosas no curso de ciências sociais.
Talvez seja um portal de passagem, pois aos 33 anos, muito do que fui vai se assentando em um solo mais profundo. Talvez porque minha condição de exilada da terra natal, me leve por noites e noites para Porto Alegre, para amigos que foram definitivos em minha formação, para amores tantos que tive por lá. Talvez porque minha trajetória seja para mim, uma surpresa. Nunca estive onde estava até fechar uma complexa rede de experiências. E tantos já se debatiam por uma nota 9,0 em estatística. Não entendia nada, nem de política acadêmica, nem de como ser próxima da pessoa certa.
Adorarei esquecer muitos fatos em menos de mês,
E morrer para este passado.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

de virada


Já estamos em 01:16 da manhâ de sábado, creio que chove em toda a cidade, isto acaba com a alegria dos jovens, colabora para o sono dos justos e favorece o silêncio das horas. Nem os cães se arriscam. nem os tiros são ouvidos. Esta chuvinha de hoje, é daquelas cuja cadência amolece os nervos, pipoca na sala, pipoca no quarto, pingos irregulares, a chuva é semnpre tema de poemas, principalmente em terras chuvosas, coisa que no Rio nem se conhece. Mas como ocidentais e amantes da luz -esperamos o sol
E amanhâ? Mais Weber
E domingo? Como Durkheim via a cidade - morfologia social e depois das 16 hoias Escola de Chicago
E segunda? De volta ao arrastão de 1992, quando foi mesmo que ser funkeiro virou crime?
Enfim, até as 18 horas, terminar este capítulo.

OLHARES SOBRE UMA VILA FORA DO NOTICIÁRIO


Amigos
Não demorou muito e meu amigo Francisco respondeu ao chamado. A Vila do Joâo no Complexo da Maré está vivendo dias de confronto aberto, mortal. Luta por território. Lá já estive duas vezes, lá tenho alguns laços de afeto. Além do baião-de-dois. Em campo, sempre penso em como descrever as principais passagens das favelas onde vou. Como na Rocinha, a rua principal é repleta de todo tipo de comércio, muita poluição sonora, motos, e pessoas, acima de tudo, indo e vindo. E pelas entradas das ruas, vamos vendo as edificações que se expandem verticalmente.
O que podemos fazer é amplificar a mensagem de Francisco para que a população fluminense saiba que moradores estão sendo alvejados, que muitas pessoas têm sua rotina de trabalho alterada, que garotos se filiam ao tráfico sem terem nenhuma vocação para bandidos.... Vamos ao que enviou Francisco:
Hoje talvez meu olhar perceba apenas o que meu coração sente. Esses dias de angústia intensa, provocada pela intensificação de confrontos entre polícia e traficantes de facções rivais e agravado pelos resultados desses confrontos talvez faça com que meu olhar não ultrapasse os muros, becos e ruas de minha comunidade. É interesse e reparar no olhar das pessoas em tempos de confrontos agudos. Estão sempre atentos a todos os movimentos, ao vai e vem das pessoas, ao menor movimento de um carro, de uma moto, as aparições em janelas, ou seja, literalmente ligados. Mais do que falcão o fogueteiro da favela precisa ter olhos de águia e agilidade de rato pra se esconder, pois disso depende a sua vida e de seus companheiros de facção. Os olhares acompanham os sons de diferentes calibres de potentes armas de fogo. Olhares que se fecham diante dos altíssimos decibéis. Olhares que se fecham mais cedo e que a cada manhã se abrem ávidos nas bancas de jornais a procura de notícias, de vestígios nas ruas, de esperança num desfecho que traga um pouco de paz. Olhares que se fecham novamente mas que dessa vez se abrem acompanhados de lágrimas de dor ao saber que mais um morador, um inocente, foi vitimado pela ação estúpida e infeliz de grupos armados. Estranhamente nada nos jornais, nada nos noticiários da tv, nada em lugar algum a não ser nos olhares e no coração dessa gente que não se cansa de olhar e não ser olhada.
Abraços, Francisco Marcelo Observatório de Favelas do RJ

Eu apóio a luta da Flaskô

http://www.flasko.blogspot.com/

SUGESTÃO DE FIM DE MÊS


Leituras sobre música popular brasileira - reflexões sobre sonoridade e cultura

Emerson Giumbelli, Júlio Cesar Valladão Diniz, Santuza Cambraia Naves (organização)

  • Assunto: Ensaio
  • Formato: 16x23
  • Número de Páginas: 420
  • ISBN: 978-85-7577-505-9
  • Ano: 2008

Leituras sobre música popular – reflexões sobre sonoridade e cultura é um livro marcado pela mesma pluralidade de seu tema: a música brasileira. São diversos os gêneros que compõem nossa música popular, assim como são variados os ritmos analisados ao longo dos vinte e quatro artigos do livro – do samba ao heavy metal, do Tropicalismo ao funk, passando pelo rock nacional, os violeiros mineiros e o Manguebeat. Os textos reunidos abordam desde movimentos e cenas até o conjunto da obra de bandas e artistas específicos durante as últimas décadas, focando sempre na multiplicidade e na interdisciplinaridade. O conjunto dos ensaios apresenta um amplo panorama em torno da música brasileira, e é leitura obrigatória para os pesquisadores e amantes da nossa música.

CURTINHA MAS RELEVANTE


DIETA DE TESE
NUM DIA CATAFLAN NO OUTRO VINHO TINTO SECO

Todos os olhares


Gostaria de propor uma criação coletiva. Sim, afinal tendo passado o dia a ler sobre o Império Romano e poder dos principados, entendo melhor as milícias e o agronegócio. Precisamos exercitar habilidades não-monopolísticas. Lutamos pela melhor tese, pelo melhor reconhecimento, enfim,,, tipos de poder dispersos mundo afora dos quais tentamos nos apropriar - mesmo em atos caridosos. Não porque eu tenha lido Weber, mas também porque o li, estas reflexões surgiram.

Mas foi em uma quarta-feira lá pelas 18:00 horas na Hadock Lobo, indo para a aula de antropologia que percebi o que agora registro: Eis que uma dama se levanta e faz sinal para descer. Enquanto se desloca pelo corredor, um popular que levava um cano em PVC de um metro mais ou menos, tendo lá seus 30 anos, acompanha o deslizar de uma mulher com idade equivalente a dele. Não era exatamente um olhar agressivo. Mas era nítido o suficiente para que deixasse entender que ali, misturavam-se curiosidade e um pouco de malícia. Que pode ser percebido no olhar de quase todo homem ao ver passar um tipo que chame atenção.

Por vezes, me espanto com o que as pessoas revelam pelo olhar: onde está a inveja se não no olhar? Em que lugar esta senhora pantanosa habita melhor que naquele olho parado, fixo que torna o resto da face um acessório- como se os olhos crescessem para engolir tudo que abarcam?
Salieri vendo a genialidade de Mozart

Onde aflora primeiro a raiva, se não nos olhos? Al Pacino em Scarface ao ver que sua irmã deitou-se com outro homem. Segundos até que se transforme numa máquina de ira em movimento de morte

Se são a janela da alma, o que pode ser acrescido é que em uma cidade de seis milhões de habitantes, são muitas as formas de olhar, muitas delas, sem o direito à imaginação. Porque imaginar é um ato de vontade que precisa de espaço. Não espaço físico apenas, mas espaços com cores. memórias e possibilidades de mudança de posição.

O que a caixa do supermercado vê diariamente são pacotes de café, de arros, legumes. Números, pessoas. Fixa de seu lugar. Por horas e horas e horas.

Dos operários sabemos que veêm pouco a luz do dia.


As crianças, como sempre foi o meu caso, passam as horas de sala de aula a olhar pela janela. A crueldade da sociedade é educá-las para que fixem um único e verde ponto - O QUADRO NEGRO.

Os presos, nosso tipo-ideal de olhar cerceado, imaginam por obrigação.

Diremos que os magnatas enxergam ondas, praias, hotéis, jóias....e não estou apresentando uma crítica quando digo que simplesmente são cegos aos porteiros, funcionários, secretárias etc.

Talvez os bons professores e os artistas, sejam aqueles que ampliam nossa visão. É claro que há o lugar da ciência, Mas ainda penso que há muito de arte em Einstein, Freud, Marx ....

Gostaria de ouvi-los sobre o olhar.
Podemos compor um post coletivo com figuras, textos etc..

observaçâo: procurei muito uma imagem do olhar de Al para ilustrar fírgura.
Mas convenhamos, o olhar de Ana Magnani vale bem uma tese. Mandem imagens de olhares e podemos criar uma galeria

terça-feira, 21 de julho de 2009

Desde Pereira Passos é assim....

Outra marca do programa de melhoramento e embelezamento da capital foi a construção de prédios culturais e a concentração das obras nas zonas Central e Sul, ratificando a intenção de valorização dos terrenos em questão. A construção da Avenida Beira Mar confirmou a estratégia de expansão do sítio. A integração de Copacabana ao espaço urbano também foi promovida pelo poder público, através do túnel do Leme (1906) e da construção da Avenida Atlântica.
Por outro lado a cidade e o espaço, que haviam se transformado em mercadoria, são cobiçados por grandes interesses. Grandes obras, grandes projetos eram exigidos e disputados por empreiteiros, construtores e outros grupos de capitalistas burgueses. O próprio aparelho do Estado era infiltrado por estes interesses, tornando o favorecimento uma prática regular do serviço público. O mais entusiasmado executor dos projetos, o Prefeito Pereira Passos, possuía ligação direta com grupos de construtores. (AMADOR E., 1997, pg. 324)
Em relação à higiene e saneamento de alguns bairros, Passos mandou canalizar rios como o Carioca, Berquó, Maracanã e sanear a Lagoa Rodrigo de Freitas. Declarou guerra aos quiosques, proibiu a atividade dos vendedores ambulantes e o exercício da mendicância.

fonte

Considerações históricas da organização espacial da Cidade do Rio de Janeiro: Um enfoque no Complexo da Maré *
Taiana Santos Jung
Geógrafa, Mestranda ENCE/IBGE – taianajung@ibge.gov.br

quinta-feira, 16 de julho de 2009

o Brasil é um pouco diferente



Bento Prado Jr.:

"Depois do programa, Sartre nos perguntou: 'Como é possível que uma empresa capitalista gaste tanto tempo ou dinheiro para que possamos fazer nossa campanha pelo socialismo? '. Ao que respondemos: "O senhor sabe... o Brasil... o Brasil é um pouco diferente".

sábado, 11 de julho de 2009

Dentro do ar

Estive fora para entrar nos eixos com minha tese. Tenho umnas 70 páginas de entrevistas para analisar e penso na composição da tese como uma partitura. Mas neste caso não foi o jazz que me moveu, mas movimentos que conheço pouco, Apenas o suficiente para lembrar de "alegro" , "andante"... ou seja, talvez por ter visto a biografia de Mozart, duas vezes nestas semanas, ando pensando em peças clássicas. Afinal de contas, mesmo com toda a genialidade de Umberto Eco, sempre podemos escrever livros sobre como escrever uma tese. Se alguns se pautam pela excelência acadêmica e dominio teórico, outros (como alguns antropólogos) descrevem até mesmo trocas de telefonemas. Cada um com seu ofício, é certo. Se eu dissesse que o melhor é um equilíbrio dos dois, não seria exatamente fiel ao que busco. Por isto a figura da ópera chega como inspiração. Cada um com suas referências. A sociologia pode matar nossa literatura, nosso lirismo e nosso bom humor. Pode matar nossa lente ampliada. Mas como ter "um estilo"? Este que admiramos nos grandes escritores como Saramago? Ou em grandes cineastas como Copolla? Bem, direi que o caminho pode ser um vale de solidão, abismos e desafios. Mas escrever uma tese, com prazos e obrigações materiais tem se revelado uma obra. E o que confere sentido à palavra obra? Não há exata medida, nem fórmula, nem estilo a seguir. O que seduz em Foucault não é apenas seu argumento. Ele desejava ardentemente encontrar as palavras que nos abalassem. O abalo de um texto é capaz de parar nossas horas. Uma vez teria dito ele, que escrevia para ser amado. Outros fazem das palavras sua guerra com o mundo. Vejam que escrevemos por razões tão distintas. Enquanto uns escreveram para aprimorar os tratados que perpetuavam a dominação de um sistema político sobre outro, outros escreveram para inflamar multidões. E o fizeram ao manifestar a estupidez de um direito natural que assegurava "naturalmente" a riqueza dos homens. O que não podemos negar , meus caros leitores, é que é o processo da escrita, que tem nos marcado profundamente como homens de um tempo onde as palavras postas em papel ainda têm importância fundamental não só no ordeamento das pulsões como na tentatica de fuga.
Minha tese terá um movimento andante, depois alegro e ao final, apresentarei à vocês algumas fíguras que lembrarão canhôes, silêncio e surpresa.