sexta-feira, 29 de maio de 2009

Grandeza, miséria do Brasil

Hoje, por volta das 19 horas, resolvi caminhar até o Engenho de Dentro, até um supermercado do bairro. Mesmo com o tempo nublado, resolvi contornar a avenida Lino Teixeira, passando por uma das entradas da favela do Jacaré. Este entorno é pouco iluminado, com alguns carros, uma pequena favela perto da entrada do túnel Noel Rosa e logo a frente, a favela Dois de Maio. Muitas mesas cheias na rua davam o tom de festa de sexta. Certa tensão no ar, reunião de motoristas de kombis e uma Upa no caminho. Crianças, mulheres, jovens com pequenos shorts; Lembrei por alguma razão de discuros sobre a pobreza e concluí: "mas é tão óbvio que estas pessoas não podem ser julgadas por viverem aqui ou pelo que fazem aqui". E tanto já se escreveu sobre isto... Mesmo assim, o discurso que afirma de maneiras diversas, que o pobre é pobre por que quer, segue presente nas justificativas de muitos. Faço a crítica, não apenas porque eu tenha uma formação humanista, não foi um pensamento cristão, nem religioso. Foi simplesmente um raciocínio ECONÔMICO. É estranho que bons amigos meus, acreditem após terem cursado ensino superior, que tratamos aqui de opção. Não é preciso ser de esquerda para compreender o óbvio que de tão solar, cega: estamos falando de concentração brutal de renda meus caros amigos. Qual o problema em simplesmente para r com a tese da culpa aos pobres? Qual o problema em encarar a histórica EXPROPRIAÇÃO feita em nosso país, sobre os negros, sobre os nordestinos? O que há de tão grave em reconhecer estas fatos?
Creio que a negação destas verdades é o que possibilita que se possa viver mais tranqüilamente, aceitando que a caridade é o limite das possibilidades alheias. Ou quem sabe dando algum tipo de justificativa sobre "vidas passadas". Ou quem sabe ainda, o que é mais comum, tomando-se como a principal medida do mérito que berra para o mundo "mas eu consegui"!E acusa tal qual juiz impiedoso todos os outros.
Que lamentável é ver esta gente mergulhada em uma ignorãncia típica dos piores tempos da idade média. Sim meus amigos, porque se quisermos dizer que a ciência, a racionalidade que tanto prezamos serve para algo, precisaremos abandonar estas justificativas obscurantistas.
Minutos depois de chegar em casa, o som das balas demarca a caída final da noite.
Ligo a televisão e resolvo escrever esta postagem porque em um destes acasos que dá corpo aos nossos argumentos, ouço " Chovendo na roseira" de Tom Jobim, Uma das composições mais fantásticas do mundo. É, do mundo todo, tanto quanto Miles Davis, Gardel, Bob Marley, Eric Clapton.... e oriente e Ásia, e o que não conheço. Uma composição arrebatadora porque traduz em melodia o ritmo rápido, suspenso no ar de um beija-flor, traduz a chuva, o amor que se perde entre as gotas de chuva, as manhâs que celebramos. Chovendo na Roseira deveria ser música obrigatória no ensino fundamental para que as crinças possam entender a grandeza de um país.
Para que elas possam voar sobre a miséria que as explora em propagandas, internet, trabalho, violências.
Mostrem aos seus filhos a letra de Chovendo na Roseira, para que possam entender o quanto é ilusória a crença de que vivemos em um país pobre. Não somos pobres e nunca fomos.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

revista Caros Amigos sobre cidade do Rio de Janeiro

CHOQUE DE CAPITALISMO NAS RUAS DO RIO LEMBRA A DITADURA

A nova administração municipal aumentou a repressão sobre os desempregados, subempregados, camelôs e trabalhadores pobres em geral.

Por Marcelo Salles


Se você está desempregado no Rio de Janeiro, cuidado. Se você não tem onde morar, redobre a atenção. Você está na mira do Choque de Ordem. Apesar de a Prefeitura negar, durante a apuração desta reportagem ficou claro que a repressão empreendida pela nova administração está voltada essencialmente contra as parcelas mais pobres do povo. Não foram poucos os relatos que ouvi de agressões contra camelôs e pessoas em situação de rua, sendo que o mais chocante foi narrado pelo defensor público Alexandre Mendes. Quando pergunto sobre denúncias de agressão física, ele diz:

“Isso eu posso falar porque presenciei, pois acompanhei e assinei o boletim de ocorrência. Houve uma agressão estúpida da Guarda Municipal. Uma senhora de 60 anos, de muleta, foi derrubada no chão e usaram sua própria muleta para agredi-la. Por pedir que não fizessem isso, um menino negro tomou uma banda e várias cacetadas e também outras duas pessoas acabaram apanhando. Foi uma ação de extrema violência”, lembra Alexandre, do Núcleo de Terras da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro. Ele explica que o Núcleo de Direitos Humanos está acompanhando denúncias de agressão e o de Fazenda Pública está acompanhando denúncias de roubo de mercadoria.

O Choque de Ordem, conjunto de ações coordenadas pela Prefeitura, mas com apoio das polícias e da iniciativa privada, teve início logo na primeira semana de janeiro. E não tem data para terminar. “Apesar de muitos terem uma dimensão de que choque é algo passageiro, acho que choque não é algo passageiro, choque é algo intenso. A prefeitura vai permanecer com essa intensidade, vai fazer valer as posturas e a lei municipal, porque não há outro caminho para a cidade do Rio de Janeiro”, explica Rodrigo Bethlen, o chefe da Secretaria de Ordem Pública, especialmente criada para comandar as ações. De acordo com os números oficiais, até março foram abordadas 5.076 pessoas, mais de duzentos mil automóveis foram multados ou rebocados e cerca de 180 mil produtos diversos foram recolhidos. Cerca de oitenta construções populares foram destruídas.

Bethlen, ex-vereador pelo PFL e homem de confiança do prefeito Eduardo Paes, me recebeu na sexta-feira, dia 17 de abril, no sétimo andar do gigantesco prédio da Prefeitura, que fica no centro da cidade. Fui prontamente atendido e todas as perguntas foram respondidas com desembaraço; trata-se, sem dúvida, de um grande quadro da direita fluminense. O secretário de Ordem Pública tem a pele branca, cabelo preto liso, barba bem feita e gesticula muito enquanto fala. Ele defende, para a Guarda Municipal, o uso de armas não letais (ou menos letais, segundo fabricantes) como os tasers – aparelhos que disparam projéteis eletrificados. É contra o uso de armas convencionais pelos guardas e acredita que o Rio de Janeiro deve se espelhar em cidades como Nova York, Chicago, Bogotá e Medellín. “A hora que você combate o pequeno delito você deixa absolutamente caracterizado que o poder público vai estar presente permanentemente combatendo essas transgressões”.

O secretário mais badalado pelas corporações da mídia fluminense afirmou que o Choque de Ordem não é seletivo. Ele citou três episódios em que as ações foram direcionadas contra gente rica: a demolição de um restaurante na Gávea, de uma casa na Barra e do prédio conhecido como Minhocão, na favela da Rocinha. “Pra mim lei vale pra todo mundo, tanto pra mim quanto para o prefeito Eduardo
Paes. Se a lei não for respeitada por todo mundo, nosso choque não tem validade”.

terça-feira, 26 de maio de 2009

sessão " Entenda sua cidade"

Lendo escritos do passado achei um de minha chegada ao Rio onde anotava como nota metodológica de trabalho de campo
" è preciso diferenciar:
Policia Policia
Policia bandido
bandido bandido
bandido formado"
São muitas as diferencições necessárias para viver na cidade....
Weber dizia que o ar da cidade liberta.

Fica a reflexão sobre o ar da cidade...

domingo, 24 de maio de 2009

Tropas de elite, de proteção e neonazismo

Peço desculpas pelo péssimo acabamento que apresentarei neste texto. Pretendia escrevê-lo amanhã. Mas o ritmo dos fatos faz com que eu registre algumas linhas hoje. Iniciando: a questão do papel do "guarda" do " subordinado" do " fuincionário que cumpre ordens" tem ocupado um espaço central nos debates sobre Alemanha e Tropas como a SS. Tema abordado no filme O Leitor -que me fez lembrar desta dicussão sobre responsabilidade, opção e consciência. Não vou desenolver estes pontos aqui. Talvez eu dedique um programa de estudos para pensar isto. O fato é que quando abro o Jornal de domingo, o preparador físico do Bope -Rio de Janeiro, posa e dá entrevista como se sua atividade fosse não só naturalizada mas também elevada à uma condição glamourosa. Este é o termo para abordar o que envolve esta força policial desde o filme. Os subprodutos deste filme, estão dentro de grandes coorporações, seminários motivacionais liderados pelos caverias, pagos muito bem por paletras sobre resistência, comando, decisão. Tenho a impressão de que se ignora a questão- MAS AFINAL DE CONTAS, QUAL O OBJETIVO FIM DA TROPA?
Desta forma, o discurso da guerra necessária, inevitável e instaurada nas entranhas da sociedade cariioca, justifica "a missão". E rende filmes, livros, peças de teatro. palestras, status.
No Paraná, um grupo neonazista é preso, delatando o envolvimento de políticos nacionais. E conexões com Chile e Argentina.
Seria possível afirmar que são fenômenos sem conexão se levarmos em conta como as representações sobre bandidos, negros, pobres em geral, parecem confundir-se em discursos oficiais? E não raras vezes, nas explicações dadas por moradores de subúrbio, bairros nobres e populares, favelas, etc... no cotidiano?
O Estado condena com ardor o neonazismo, como expressão de um comportamento inaceitável. O EStado, mídias e empresas, premiam batalhões especiais pelas habilidades técnicas de seus homens de ferro.
A Universidade - e acompanho de perto este fato, não me libero da responsabilidade- certifica algusn destes como hábeis também na capacidade reflexiva - o Estado investe nesta formação.
Mas qual o objetivo de neonazistas e policiais de forças especiais? Mudam os métodos? Talvez, mas não é o aspecto mais importante. Mudam os alvos? Não, são pobres, negros, homossexuais. Ambos partilham de alguns alvos em comum. O que há de diferente então?
O que há de diferente, creio eu, é a chancela do Estado em relação aos batalhões especiais. Necessários à qualquer Estado Democrático de Direito que precise apresentar garantias em segurança pública á população.

sexta-feira, 22 de maio de 2009

sessão "para ler e meditar"

Como um piano de cauda chega ao topo do Pavão- Pavãozinho?

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Notas sobre Porto Alegre

O fato é que olhando a cidade hoje, vejo um número considerável de porto-alegrenses que sendo do interior, poder-se-ia dizer, em alguns casos de cidades rurais, em sua vinda para capital não passam por uma adesão aos “valores modernos e emancipadores” da cidade (posso depois escrever sobre o que penso ser isto, por ora basta dizer que há um elemento de liberdade inerente à modernidade, mesmo que incompleto e questionável por pensadores como Foucault). Talvez esta nem seja uma característica de Porto Alegre, mas creio que na cidade, este quadro é bastante explicito. Os valores que são expressos no discurso de que “ sempre há uma faxina para fazer, uma capina para fazer e uma criança para cuidar” expressam muito do que já ouvi na cidade. De descendentes de alemães e italianos principalmente. Na cidade, estes valores vem se sobrepondo, na medida em que a promessa de tornar-se uma cidade nos moldes de Barcelona, que se constituía como um espaço de oposição e pluralismo como o Fórum Social Mundial, se desfez com uma perda retumbante do PT. Tenho uma impressão de que houve primeiro um congelamento do que existia em termos de avanços culturais, educação, etc. E depois um leve retrocesso que cede espaço ao império dos discursos racistas daqueles grupos que historicamente se colocam como colonizadores. A tese do FHC sobre o negro nas charqueadas deveria ser trabalhada no ensino fundamental. Temo perceber o tamanho da distorção histórica que se amplificou no Rio Grande do Sul a partir deste mito de colonização diferenciada. E, peço desculpas aos meus amigos que reproduzem estes equívocos, pela minha falta de paciência.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Roda Viva – domingo de maio – Porto Alegre

Já faz muitos meses que pretendo escrever sobre o Choque de Ordem. Mas como classifiquei como absurdas tantas das ações, acabo por não ver motivação. Os Neros se apresentam. No dia do jogo do Flamengo contra o Inter, ficamos todos espremidos em um bar da Tijuca. A limpeza das cidades, (que ocorre também sob o governo Fogaça) com o deslocamento do camelódromo em Porto Alegre, como certamente ocorre em outras áreas urbanas, responde a um desejo de ordem, disseminado como um desejo da opinião pública. Para embelezamento das cidades. O prefeito Eduardo Paes, tem na idéia de CHOQUE seu leitmotiv governamental. Ele atua como um jovem gerente moderno da segunda maior cidade do país. O discurso de Paes é pautado no choque de ordem, choque de gestão. Hoje particularmente ele está ao vivo , atacando o populismo vulgar que tomou conta do Rio de Janeiro. Desta forma, justifica a construção dos muros em favelas. Eduardo é o prefeito anti-bossa nova, o grande ordenador, o anti-esteta, o morador que assume seu coração suburbano para acusar os moradores da zona sul, o prefeito que odeia a sujeira de uma cidade que nunca se normalizou, e que tem sua identidade marcada exatamente por isto. Não se trata mais de um público, mas da administração da limpeza – limpa-se os camelos, as mesas dos bares, os botecos dos bairros.Enfim, Eduardo é a geração que tenho visto por aí: obssessiva por uma colocação, canibal, técnica, que pensa ser a competência a maior das habilidades necessários aos novos homens. Eduardo representa uma geração que não relaxa. Não sou freudiana, mas esta obsessão com choque e limpeza pode ser interpretada.

terça-feira, 12 de maio de 2009

Séries policiais- nacionais

Depoimento de Marcílio Moraes - direitor da Série A lei e o Crime da Record, e de Vidas Opostas, novela que apresentava uma verdadeira etnografia do tráfico no Rio de Janeiro, com direito a espadas, um delegado sádico, muito armamento e mílicias:

Pretendo tratar dessa ambigüidade entre lei e crime que existe no Brasil. Aqui se justifica o policial miliciano, que mata bandido. Em muitos lugares, o traficante é a lei. Às vezes, as pessoas preferem a lei dele à da polícia, que é mais truculenta. A história será montada para mostrar os limites dessa zona cinzenta entre lei e crime, por isso o título.

Muito diferente do Jack Malone, que tendo ascendência mexicana, chefia um setor MUITO IMPORTANTE DO FBI. Não se trata de mostrar a realidade mas de criar uma realidade que me faz lembrar as falas de uma dezena de policiais em aula " é professora, mas lá eles têm todo equipamento, equipes, etc....eu vi num filme"

Nossas séries têm a pretensão de um realismo como entretenimento?

Sessão FIQUE ATENTO - acontecendo agora

Acredito que o cinema nacional encontrou na favela, desde Cidade de Deus, um filão que não se esgotou nos últimos anos. Um dos frutos mais doces e rentáveis deste filáo se desdobra em três séries de tv aberta, todas muito contundentes sobre a realidade complexa de nossos órgãos de segurança, polícia, sistema penitenciário, policia judiciária, policia civil. Creio que Tropa de Elite (que está em cartaz como peça de teatro no Rio, com direção de Domingos Oliveira e texto de L. Eduardo) colaborou para explicitar nosso infinito interesse sobre os meandros da vida policial nas grandes cidades. Estas séries, ao contrário de Cold Case (que assisto para dormir e porque alguns argumentos são realmente bons, além da música final que vem traduzida e é muito emotiva), Divisão Criminal (que assisto pois gosto da chefe Jonhson) e Without a Trace (que assisto porque gosto do detetive Jack Malone e sua equipe) - as séries brasileras exploram não a ordem, mas o caos, o borrado das relações, a luxúria, o desejo por poder, a arbirariedade. Aí está Força Tarefa, São Paulo 9mm e uma série da Record, inspirada diretamente em Tropa, inclusive parte do elenco. No início da noite, temos Datena, São paulo - que interpela José Serra pedindo que ele atenda ao telefone, etc...vocês já viram.No Rio, entre 12:30 e 15 horas, Wagner Montes é líder de audiência. Meus alunos disseram que as pessoas assistem por curiosidade,
Eu assisto as séries no SBT por que tenho insônia, porque é engraçado ver como os casos sempre são de pessoas comuns, ou seja, para fora da instituição:são negros, migrantes, ex-combatentes de guerra, belas garotas que apanham do marido,enfim - ESCOLA DE CHICAGO. Assisto sem compromisso com a instauração de um processo reflexivo, não como entretenimento puro, mas sei bem do que se trata.
Mas no caso do Brasil... não creio que seja puro entretenimento, quantas vezes percebemos as pessoas repetindo " é exatamente assim que acontece" - a televisão cria um discurso sobre fatos - e agora entrou em pauta a questão criminal, se quiserem chamar assim. Não só por picos de audiência. Creio que há uma possibilidade de jusitificar condutas policiais - e um vácuo da discussão sobre o que de fato tem representado a política de segurança em estados como Rio de Janeiro e Sâo Paulo.
O que há de fascinante no recalcado submundo?

sessão FRASES DO DIA

AMIGOS
Crio esta sessão para meditar sobre frases que podem elevar nossa compreensão da vida (como ela é). Esta sessão é uma homenagem ao jornalista Hélio Fernandes que por morosidade da justiça brasileira, teve de interromper as atividades do único jornal digno da cidade do Rio de Janeiro. Nos últimos tempos, já on line, Hélio dedicou sua coluna ao presidente com o ótimo título " Para o presidente Lula ler e meditar". Então irei ao longo dos meses apresentando algumas frases endereçadas ou não à algumas personalidades nacionais. A primeira delas é para o secretário de Segurança, importado do Rio Grande do Sul, José Mariano Beltrame.
para o secretário ler e meditar:
" O chefe da polícia pelo telefone mandou avisar, que na Carioca há uma roleta para se jogar"...
Em breve comento de onde vem esta pérola do cancioneiro popular registrada por Donga - um dos primeiros sambas registrados no Brasil, mas é claro, há controvérsias sobre quem de fato é o autor do samba.

sábado, 9 de maio de 2009

Brasileiros em Portugal, portugueses na França

Em um restaurante português na Tijuca, numa quarta de outono, compartilho no salão, com uma mesa de conhecedores da cultura portuguesa, que assistem a um jogo de futebol. O dono está entre eles e conta animadamente em tom de comparação, sua viagem à Barcelona realizada meses atrás. Não era minha intenção, prestar maior atenção naquela coversa. Mas havia saído de uma aula, onde discutimos um texto de Antonio Firmino da Costa sobre uma festa popular em Barrancos, na região do Alentejo. O que chamava atenção no texto, era sua descrição dos fluxos migratórios. Conforme o autor, a dinãmica da imigração a partir da África, Brasil e leste europeu era uma tônica em Portugal. Conheci muitos portugueses no mês em que estive na França. O primeiro trabalhava na portaria da casa de estudantes Lucien Paye que fica na Cité Universitaire em Paris, o segundo, era atendente em uma lan house, o terceiro, bilheteiro de metrô, e assim por diante. Lembrei disto ao vê-lo falar do primor que era Barcelona. Como as cidades crescem e se desnvolvem? Que mão de obra as sustenta para que brilhem na qualidade dos serviços prestados?
Lembrei ao mesmo tempo, das tradições alemãs e italianas do sul do país e segui com uma reflexão sobre cultura dinâmica e a invenção das tradições da qual fala Hobsbawn. Em aula, havíamos discutido sobre o fato de que portugueses trabalham em postos precarizados na França e brasileiros trabalham em postos precarizados em Portugal. Mas a representção dos brasielrios, feitas pelos portugueses que conheço no Rio de Janeiro, é outra. Lembro de um taxista português comparando Rio de Janeiro e Lisboa: reclamava das "caixinhas" que haviam aqui, entusiasmado com o programa de Gugu Liberato que dava condições aos nordestinos, de voltarem para sua terra.
É sempre curioso ver como certos grupos e indivíduos mantêm sua identidade a partir de representações; a) em relação ao lugar que ocupam no país, como ser dono de um restauirante na Tijuca e reclamar das condições de vida ofertadas aqui; b) em relação aos seu grupo, cujos valores morais são distintivos - valor do trabalho, família ordem; c) na possibilidade de apresentar-se como parte de uma civilização superior, a européia, acessando memórias de viagem, parentes que lá residem, filhos que lá estão ou estudam, etc..ou seja, relações de proximidade.
Termino a postagem com esta cena: Uma informação na televisão, remete à um fato que ocorreu no interior do Ceará. Entre goles de vinho tinto, comentam que se o Ceará já é interior, imagine o interior do Ceará. Riem muito e com explicíto deboche. Segundos depois, vem servi-los Durval, o único garçom no restaurante vazio, um garçom, que me revelou depois, vem da " terrinha", ou seja, do Ceará para onde pretende voltar e viver sua velhice.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

entrevista gélida

Entrevistando Daniele Miterrand, Jô Soares estava mais fora do que nunca. Sem querer entrar em nenhuma das questões que ocupam e ex-primeira dama francesa, como seu apoio aos sem terra e aos índios, resumiu-se a perguntar dados biográficos, fazer comentários desgraçadamente infelizes " Deve ser dificil ter botas de outros marchando sobre nossa terra" - ao que foi lembrado da colaboração francesa com a Alemanha nazista. A entrevista não decolou e acabou rapidamente, com uma secura evidente. Nâo é de hoje que este programa ganhou uma característica: exaltação do que há de banal ou midiaticamente espetacular, nenhuma possibilidade de discussão mais densa. Creio que Jô deve preparar seu roteiro lendo a wikipédia. Se quiserem tirar esta dúvida, vejam a entrevista e depois leiam o verbete. Segue a mesma cronologia. Só faltou falar do comandante Marcos e de Fidel Castro. Mas imagino que ele tenha uma lista de uns cem nomes que nunca devem ser pronunciados em seu programa. Por isto, nada mais útil que levar um homem vestido de foca, o vendedor de pamonhas de Piracicaba e o cantor escatológico Rogério Skylab, que aliás disse que já morreu. Prato cheio para quem lê Gui Debord, não?

o MORRO NÃO TEM VEZ...E O QUE ELE FEZ JÁ FOI DEMAIS.

Em uma das idas a campo no Morro do São Carlos, um simpático dono de bar me contava das dificuldades em conseguir ritmistas atualmente. Criado em uma época onde em qualquer lugar se batucava, lamentava estas transformações. Vejo muitos estudos sobre as escolas de samba, poucos sobre estas aspectos. Nei Lopes, uma raridade, confesso que queria ler mais. Estou aqui neste exato momento pensando sobre comunidade, interações face a face e lugares como densidades afetivas. Reflito a partir do texto de Patricia Birmam no livro de meu querido orientador (quem me conhece sabe que esta seda é rara), Luiz Antonio Machado, ou simplesmente "Machado". O livro, Vida sob cerco trata do cotidiano das favelas cariocas. Para quem estuda o assunto, fica a indicação.
O fato que narraram em julho de 2008 é que as quadras de escola de samba estavam esvaziadas com exceção da Beija Flor e de certa forma da Mangueira. Um objeto de pesquisa tão central, principalmente para antropologia, esvaziado? Confesso que desci o Sâo Carlos ainda mais intrigada- e a pesquisa seguiu confirmando o que ali me narraram: uma geração que não tinha o envolvimento comunitário com o samba, o samba virando patrimônio a ser protegido e não reconhecido como " imaterial". O bloco Deixa Falar nasceu com este objetivo, segundo Flavinho. Ser um ponto de encontro para quem gostasse de bom samba. Imagino, como Zaluar já havia observado, que a escola de samba fosse um destes lugares afetivos. Quem sabe o principal em determinando momento? Bem, seguirei tratando disto, ainda devo o texto sobre gosto.

CULTUIRA, CULTURAS.

Quando resolvi voltar ao tema da cultura no doutorado, após ter trabalhado racismo no mestrado, de uma forma mais canônica (e nem tanto assim), com um objeto clássico para sociologia e antropologia no Brasil (basta lembrar de Bastide, Freyre e Florestan, Oracy Nogueira e Silva e Hasenbalg,etc,) não tinha exatamente consciência das dificuldades. É incrível o processo de transformação durante a tese. Provavelmente por ter recebido uma formação precária na graduação, entre 17 e 22 anos, eu viva aos trancos em teoria. Se pensamos, focando a cultura popular, o caminho do samba no Rio de Janeiro e sua forma (para ser justa com Candeia) de incorporação pela cidade, o mesmo não ocorre com o funk em 2009. Este é um dos níveis do problema entre cultura e política. Muitos trabalhos sobre o tema da cultura têm se restringido à exuastivas descrições sobre a expressividade dos grupos estudados. " Os artistas da rua Esperança, performances e cultura ", " Os repentistas da praça da Sé", etc...Outros têm enfatizado a relação entre cultura local (tradicional, popular) e globalização, tratando então, das "mélanges" e do processo de "bricolage" cultural. Poucos ainda estudam índios, a tônica é pesadamente urbana, mas com este viés descritivo, ou seja, uma problematização de baixo impacto (considerando impacto para pensar relações sociais mais amplas, questões sobre poder, dominação, integração, tão caras à sociologia) já que o grupo estudado é normalmente definido por aspectos particulares considerados peculiares e distintivos, estudados como microcosmos, sem que seja necessário fazer relações. É o fantasma da generalização e da ideologia pairando sobre nossos trabalhos, corretos de um certo ponto de vista acadêmico, não lidos por mais de 6 pessoas. Financiados por agências de pesquisa. Seriam mais ou menos 86 mil reais aproximadamente para uma tese tratando de festivais de música eletrônica.
Meu desafio em uma tese sobre cultura de favela, é fugir desta particularização. Em um primeiro momento, interessava saber como o estado estava utilizando o hip-hop como instrumento pedagógico de controle social, em um segundo momento, interessava o discurso dos rappers na relação com o EStado. Mas o campo trouxe esta realidade que no Rio, não tem a coerência esboçada em meu projeto. Entra o desafio. Tratar de cultura, além da descrição, em tempos de multiculturalismos rasteiros. A falta de conhecimento histórico e o dogmatismo acadêmico apenas amputam nossa imaginação sociológica (devo esta ao JV. Tavares). Seguirei esta semana neste assunto, pois prometi ainda abordar interaçãoes faca a face e quero falar de gosto. O material da internet, é perfeito para analisar as formas de apresentação de si. Já devem exsitir milhares de análises sobre dizer que " gosto de jazz, cinema italiano e viagens, de preferência para países da Europa". Ou " adoro esportes, praia e baladas". Bom, antecipei o assunto, mas é isto.

domingo, 3 de maio de 2009

São 18:34, Flamengo campeão estadual, nos penáltis. Cidade explodindo e rajadas. Foram 80 mil torcedores do Flamengo ao Maracanã. Um Botafogo espetacular. Fica a sensação estranha, pela terceira vez o quadro se repete. Fica para análise pensar a pressão sobre um jogador que decide em uma cobrança o destino do time e seus milhares de torcedores. Não é algo titânico?
Eu, completamente leiga de tudo em futebol, passo por estes momentos de tensão. Confesso que depois de Linha de Passe, o filme, passei a sentir de outra forma. Vendo a torcida do Corintians; A rivalidade entre Grêmio e Inter não me suscitava estes sentimentos. Creio que o fato de chamarem os torcedores do Inter de "macacos" e o fato de uma ter o símbolo do Saci e outra o de um mosqueteiro, constituem os fatos que mais me despertam interesse. Mas aqui no sudeste, os milhões de motoboys, porteiros, camelôs, etc... que vivem o sentimento primário e clânico do futebol, ah, isto me comoveu desde minha segunda passagem por aqui. Hoje, saí com vestido poá. Mas não tinha percebido que poderia ser interpretada como aderência ao Fogão. Dia de outono, luminosidade fantástica, carros com bandeiras, todos com camisetas. Grande domingo, essencial para entnder o que significa viver Rio de Janeiro, no subúrbio de frangos girando,

Tiros de domimgo

Como tantos outros moradores da cidade do Rio de Janeiro, em 5 anos me acostumei com os tiros. Aprendemos sobre suas regularidades e se prestarmos atenção, aprendemos a discernir alguns momentos e o tipo de uso das armas.
Momentos mais freqüentes: As noites, após as 22 horas. Podem ocorrer por teste de armas.
Momento mais assustador: compreender pelo tempo dos tiros que se trata de enfrentamento com a policia. Explicarei: uma rajada seguida de 1 mínuto de silêncio e o som de outra arma. Basicamente um "diálogo" de pergunta, resposta e revide.
Momento festivo: jogos de futebol do Flamengo e chegada de carregamento
Momento incomum e igualmente assustador: as oito da manhâ. Horário fora deste quadro. Escrevi este post exatamente por ter ocorrido o último momento às 710 de domingo.
Há um texto de Patricia Rivero na internet sobre o significado simbólico das armas. Na linguagem de seus usuários elas "cantam". Em breve falarei disto ao analisar os proibidões.
Hoje é dia de clássico : Flamengo contra Botafogo
Ganhei minha primeira camiseta de uma ex-mulata do Sargenteli que morava na Cidade do Som. È uma camiseta do Fogo da década de 70. Mas tem o Garrincha, a Elza e isto justifica todo o resto. Sou Fogo de coração.
Não nego como socióloga que hoje a cidade vira febre. Flamengo é um fato social total. Já fui captada no Mosso do EStácio pela sensação impar de fazer parte dsito. Neste momento, bombas - é o jogo. Provavelmente os tiros são po isto. Vocês sabem, este pessoal não dorme cedo.

sábado, 2 de maio de 2009

De Jacaré pela Lagoa

Como a idéia deste blog é pensar a cidade e suas interações. hoje registro um ponto que sempre me chamou atençâo: a diferença dos normalmente classificados " meninos de rua" na cidade do Rio de Janeiro e na cidade de Porto Alegre. Se a segunda, menor (mais ou menos um milhão de habitantes) tem uma população muito menor de meninos que vivem na rua, a primeira é uma das capitais mais populosas da América Latina (5.851.914 habitantes). Bem, se fossem apenas números... mas temos as formas de ocupação, colonização de cada uma delas. O Rio de Janeiro, não é segredo, teve desde sempre uma ocupação de portugueses e mais tarde negros escravos entre tantos outros. Também não é segredo que não houve política pública de inserção desta população no período da abolição da escravatura. O lugar ocupado por esta população? Primeiramente os cortiços. depois as favelas. Quem transita pela cidade hioje, ano de 2009 entende que a negociação é condição essencial para realização de algumas tarefas, No caso de nossa história de hoje, e aí está a diferença entre as duas cidades, o motorista é uma autoridade. em constante prova na direção de seu "carro". O transporte público de Porto Alegre é bastante organizado, não há espaço para plasticidade e negociação. Os pontos são pontos de parada e não mais a frente, mais atrás ou na esquina da Duvivier. Não há bate-papo, o motorista não solta piadas para quem entra.
A pressão exercida pelos moradores de favela estabelece uma dinâmica muito particular, principalmente nas áreas que passam ou terminam em favelas, como é o caso da linha 4740-Jacaré e 629- Irajá. Além de dirigir, cobrar, liberar a roleta, o motorista tem de negociar com os meninos que pedem carona. Se proibidos, podem ocorrer pedras em direção ao ônibus ou então, entram pela janela. Querem ir à praia, Copacabana, centro. Não há imperativo categórico que moralize esta dinâmica. E há uma gradação de freqüentadores que vai desde pessoas que de fato moram na rua, até trabalhadores que pedem carona utilizando o termo " abençoado". E ainda temos os que contam que foram roubados na rodoviária Novo Rio e não conseguem voltar para sua cidade. Estas viagens sempre são carregadas de negociações. Podemos ver uma dama da lotação que fará o motorista parar tudo por cinco minutos só para ouvi-la marcar um encontro na Feira da Sâo Cristóvão. E existem as batidas cotidianas na área próxima da rodoviária, agressivas e desacreditadas, feitas pela policia militar geralmente às 16:00 horas. Sempre acho muito irônica a expressão "200 anos, sempre com você" . No Rio, isto não suscita nenhuma sensação de seguranças. O efeito pode ser contrário na verdade.
O fato é que a presença da favela na cidade, obriga - contra todos os choques de ordem desde o século XIX, o Bota Abaixo...a negociação. E existem parâmetros para avaliação: humildade de quem pede, generosidade de quem dá a carona, aceitação de quem sabe que estas áreas têm esta marca.
As interações face a face são marcadas por tantas assimetrias sutis que me dedicarei a descrever algumas delas nos próximos dias.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

As razões para criar um blog

Desde que o jornal Tribuna da Imprensa fechou, tenho andado um pouco triste. Os dias são corridos, mas a verdade é que sem um veículo para onde escrever, tenho sentido uma espécie de amputação. Sim, vejo histórias pela cidade toda, imagino contos, situações, descrições, reflexões. E nada. Não criei um blog para ser lida, Na verdade, criei um blog (e não deve ser lá muito raro), para poder escrever todo dia. São milhões de blogs pessoais e meu desejo era dar um nome como OBSERVATÓRIO URBANO. Mas já existe. Não queria remeter ao latim e aos gregos - um recurso tão utilizado. Queria pensar o movimento da urbe e seus cidadãos. Este é o tom deste blog, sua veia principal. Nasce em um primeiro de maio crítico, em meio a uma crise mundial. No momento onde por força de meu ofício como professora, descubro países como a República Democrática do Saarauí. Terminando uma tese na cidade do Rio de Janeiro, pensando que exatamente esta vida é para ser vivida. Assim, me despeço das desejos de Belerofonte e dou a mão para Hades. Passando um portal cheio de terra. Esta mesma, finita, sem metafísica.